12 ago 2022

Arte

E se “O Grito” (1893) não estiver gritando?

“O Grito” (1893) de Edvard Munch é uma das obras expressionistas mais marcantes do movimento e revela características instigantes

O Expressionismo foi um movimento artístico de vanguarda ocorrido no início do século XX, especialmente na Europa. Obras deste movimento costumam ser caracterizadas por representar uma visão deturpada e um pouco pessimista do real, uma vez que envolvem o contexto de conflitos da Primeira Guerra Mundial (1914-1918).

“O Grito”, de Edvard Munch, é uma das obras expressionistas mais importantes do movimento, mas nem todas as pessoas que conhecem “O Grito” sabem das curiosidades que compõem esta peça de arte. A primeira é o fato de que, diferente do que se imagina de uma obra renomada, “O Grito” não é uma peça única – ele faz parte de um conjunto de quatro obras, de mesma ilustração, com detalhes técnicos diferentes. 

Um dos quadros está em exposição permanente na Galeria Nacional de Oslo, na Noruega, enquanto outras duas versões estão no Museu Munch, também na capital norueguesa. A última versão foi vendida em um leilão por mais de 119 milhões de dólares. Porém, mesmo com quatro versões da obra, em todas elas está representado o mesmo desenho: uma figura humana, aparentemente assustada, em uma doca durante o pôr do sol que intriga quem assiste a cena.

Sobre o pintor, Edvard Munch

Para entender um pouco sobre “O Grito”, é necessário conhecer o artista da obra. Edvard Munch foi um pintor norueguês que frequentou a Escola de Artes e Ofícios de Oslo; muitas das obras do artista são marcadas por angústias e transitoriedade que Munch passou ao longo da vida, como o falecimento de sua mãe e irmã. “O Grito”, pintura de 1893, foi pintado quando Munch tinha 38 anos e faz parte de uma série de obras chamada de “O Friso da Vida”. A série é composta por outras pinturas como “A Menina Doente” (1885) e “Amor e Dor” (1893-94) que também compõem cenários e situações melancólicas, com  a presença de figuras humanas sem rosto bem definido.

"Amor e Dor" (1893-94), por Edvard Munch/ Domínio Público

“O Grito” (1893)

"O Grito" (1893), por Edvard Munch/ Domínio Público

A ilustre pintura “O Grito”, de Edward Munch, conta com uma pessoa aparentemente angustiada, assustada, com as mãos na cabeça. Na obra, esta figura humana não apresenta traços específicos que indiquem se é um homem ou uma mulher. Há quem acredite que possa representar um auto-retrato do autor, uma vez que um registro de 1892 do diário de Munch retrata uma situação muito similar a da obra vivida pelo artista, e que poderia ter sido a motivação para o quadro. Mas, mesmo que a obra retrate uma situação vivida pelo artista, existe outra hipótese para a identidade do personagem principal da pintura.

E se “O Grito” não estiver gritando?

Ao organizar uma exposição com mais de 50 gravuras e litografias de Edvard Munch em 2019, o Museu Britânico (The British Museum), fundado em 1753, levantou a possibilidade de que a figura humana central da obra “O Grito” seja inspirada em uma múmia peruana, exposta no antigo Museu de Etnografia de Trocadero, em Paris, em 1889, e que supostamente Munch teria visitado. Assim, esta teoria sustenta a ideia de que a figura central da obra não estaria necessariamente gritando, e sim apenas tapando os próprios ouvidos de “gritos interiores” que o levariam a extrema angústia.  

Múmia Peruana/ Acervo DigitalMúmia Peruana/ Acervo Digital

Quando o céu ficou vermelho

Outra característica que chama atenção na pintura de Munch é a cor do céu vermelho-sangue, como Munch descreve em seu diário na situação que supostamente teria influenciado o artista a ilustrar a obra. Pesquisadores astronômicos publicaram em fevereiro de 2004, revista Sky & Telescope, um trabalho chamado “Quando o céu ficou vermelho: a história por trás do Grito” que levanta a fiel hipótese de que o céu vermelho-sangue teria relação com uma erupção vulcânica em Krakatoa, na Indonésia, em 1883. Tal evento da natureza deixou “brilhos crepusculares vermelhos”, como descreve a notícia sobre a pesquisa no portal Sky Telescope, até quase um ano após a erupção e que, de acordo com os pesquisadores, podem ter sido observados de Oslo, cidade de Munch.

Assim, os pesquisadores estiveram no local que a pintura “O Grito” a princípio retrata, em Oslo, na Noruega, e concluíram pela direção que a obra foi pintada, com o olhar para o sudoeste, confirma a teoria de que o vermelho do céu seriam consequências da erupção vulcânica em Krakatoa, já que era naquela direção que a ilha ficava. 

A erupção de Krakatoa é considerada uma das erupções vulcânicas mais fatais da história, uma vez que desapareceu A ilha de Krakatoa inteira, localizada no estreito de Sunda, entre as ilhas de Sumatra e Java, na Indonésia.

Litogravura de 1888 da erupção de 1883 do KrakatoaLitogravura de 1888 da erupção de 1883 do Krakatoa

Mesmo que a erupção vulcânica tenha acontecido 10 anos antes da primeira versão de “O Grito”, ainda sim acredita-se que esta é uma hipótese válida porque as características das obras de Munch costumam carregar particularidades que remetem a eventos de anos anteriores da vida do artista.

“Só poderia ter sido pintado por um louco”

Uma terceira e curiosa característica de “O Grito” (1893) é que na versão exposta no Museu Nacional da Noruega é possível perceber uma frase escrita a lápis no quadro que diz “Só poderia ter sido pintado por um louco”. Muito se especulou sobre quem teria sido o autor dessa frase, e por muito tempo acreditava-se que as palavras pudessem ter sido escritas por um crítico da obra, que não tivesse gostado do que tinha visto. Isso porque, inicialmente, “O Grito” não foi bem aceito pelos críticos de arte e esta frase foi percebida na pintura apenas quando foi exposta em Copenhagen, no ano de 1904, onze anos depois da pintura da obra. Mas, depois de uma análise da caligrafia ligada à frase e demais detalhes, chegou-se à conclusão de que a frase teria sido escrita pelo próprio autor da obra.

Veja também